sábado, 30 de maio de 2020

Republicação - Sete Linhas de Umbanda



As Sete Linhas são um dos maiores Pilares da Religião de Umbanda, senão o principal Pilar.

As Sete Linhas de Umbanda são as 7 Manifestações Divinas, são Sete Vibrações de Deus, Sete Energias, que dão sustentação a tudo o que existe em nosso planeta. A Umbanda tem nas Sete Linhas seus fundamentos e só conhecendo-as muito bem conseguimos entender a razão de tantos nomes simbólicos usados pelos guias espirituais. 

Nunca confundam Sete Linhas com Sete Orixás! Não é isso! Elas são como se fossem "o Espírito de Deus" manifestado em "sete partes". Através delas é que surgem e se manifestam os Orixás na Umbanda.

Portanto, cada Linha tem seus Orixás atuantes, podendo alguns deles surgir em mais de uma Linha, de acordo com a particularidade Energética, Magnética, etc.

Podemos encontrar diversas formas de classificação para as Sete Linhas de Umbanda, dependendo do segmento o qual a Casa tem como base. Quando a Umbanda começou efetivamente, no começo do século XX, os guias falavam da existência das Sete Linhas, porém não a expunham aos médiuns e dirigentes o que levou alguns deles a elaborá-las didaticamente.

Oficialmente, a Umbanda começou com a manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, mas já haviam manifestações de Preto-Velhas e Caboclos pelo Brasil afora há tempos.

Quando a Umbanda foi “popularizada”, percebiam-se os que seguiam os fundamentos originais do Caboclo das Sete Encruzilhadas e, também, os médiuns oriundos dos mais diversos cultos de Nação, levando a uma grande mistura de procedimentos religiosos. 

Os novos dirigentes de Umbanda, na falta de recursos teológicos e doutrinários próprios da Umbanda, acabaram buscando no Candomblé suas bases fundamentais.  Por outro lado, os cultos de Nação se aproximaram da Umbanda em busca de uma escapatória para a “ilegalidade”, já que seus cultos eram perseguidos fervorosamente pela polícia.

Acontece que o Kardecismo já tinha reconhecimento oficial e nessa época os umbandistas também buscaram seu reconhecimento como “espíritas”, batizando suas tendas com nomes que remetiam ao kardecismo.

 Os candomblecistas buscaram adquirir o direito à legalização das suas práticas e, logo, os Cultos de Nação seguiram os mesmos passos da Umbanda outrora, aproximando-se do então “Espiritismo de Umbanda” para conseguirem o direito de praticar seus Cultos.

O resultado disso foi a desfiguração da Umbanda do Caboclo das Sete Encruzilhadas em diversos segmentos de Umbanda, que, com o passar do tempo, fez com que cada Tenda, ao seu modo, formasse novos dirigente, e grande parte deles não tinha o discernimento para entender os processos sociais que os terreiros vivenciaram, assim passaram cada qual a se ver como os verdadeiros herdeiros dos fundamentos de Umbanda.

Geralmente, um médium umbandista se inicia em uma Casa, aprende seus fundamentos e doutrina suas entidades e seus hábitos àquilo que aprendeu.

Muitos acabam achando que só aquilo que aprenderam é o "certo" e o restante está "errado". Poucos foram e são os que olharam e olham para o lado e tentaram ou tentam entender a doutrina alheia ao invés de criticá-la.

Entre as diversas classificações que existem ou existiram, destacaremos algumas, mais populares.

Só saibam que eu as coloquei aqui apenas para conseguir ilustrar as diferentes interpretações que se dão, pois muitas existem e não dá pra colocar tudo neste texto.

Vejam algumas:



Umbanda Popular e/ou Traçada


Linha de Oxalá

Linha de Yemanjá

Linha do Oriente

Linha de Oxóssi

Linha de Xangô

Linha de Ogum

Linha das Almas ou São Cipriano


Linha de Oxalá

Linha de Yemanjá

Linha de Xangô

Linha de Ogum

Linha de Oxóssi

Linha das Almas ou Preto-Velhos

Linha de Omolu


Linha de Oxalá

Linha de Ibeji

Linha de Oxóssi

Linha de Ogum

Linha de Xangô

Linha das Mães

Linha de Omolu


Umbanda Esotérica e/ou Iniciática


Vibração de Oxalá

Vibração de Yemanjá

Vibração de Xangô

Vibração de Ogum

Vibração de Oxóssi

Vibração de Yori

Vibração de Yorimá


Umbanda Sagrada


Linha da Fé

Linha do Amor

Linha do Conhecimento

Linha da Justiça

Linha da Lei

Linha da Evolução

Linha da Geração




No Templo de Umbanda Luz Divina, seguimos a interpretação das Sete Linhas segundo o ensinamento e a outorga do Senhor Caboclo Ventania, Guia-Chefe da Casa e meu Mentor espiritual. Portanto, como Sacerdote e fundador do Templo, sigo e aplico o Axé Ventania, conforme abaixo:



  • Linha de Oxalá ou da Fé
      Oxalá

  • Linha das Águas ou do Amor
       Yemanjá, Oxum, Oxumarê, Ibeji, Nanã


  • Linha das Matas ou Conhecimento
       Oxóssi


  • Linha de Ogum ou da Lei
       Ogum, Iansã


  • Linha de Xangô ou da Justiça
       Xangô, Iansã, Obá


  • Linha de Omolu ou da Evolução
       Omolu (Obaluaiyê), Nanã


  • Linha da Vitalidade 
       Exu, Pombagira



Portanto, se me perguntarem quais as Sete Linhas de Umbanda, respondo que no Axé Ventania são essas. Porém, meus irmãos, o mais importante que se devem lembrar é de que não importam os nomes que se dêem às Linhas, mas a fundamentação e sua significância nos trabalhos de Umbanda. 

O que não pode acontecer é o desrespeito, pois no fundo, o Mistério das Sete Linhas é tão complexo que cada segmento apenas as denomina de acordo com sua interpretação desse grande Fundamento da Umbanda.

Saravá as Sete Linhas de Umbanda!!!

E assim a macumba continua...


Matrizes da Umbanda - Espiritismo


    Hippolyte Léon Denizard Rivail nasceu em Lyon no dia 03 de outubro de 1804, mas foi com o nome de Allan Kardec que ficou mais conhecido o pedagogo e codificador do Espiritismo. Era de família católica, filho do juiz Jean Baptiste Antoine Rivail e de Jeanne Louise Duhamel, estudou na Suíça e se bacharelou em Letras e Ciências.

    Allan Kardec era poliglota e de mente brilhante, voltada ao cientificismo e sob forte influência do positivismo em voga à sua época. Em 1850 aposentou-se como professor e a partir de 1854 começou a estudar os fenômenos espíritas sob a ótica científica, sempre precisando da ajuda de outros médiuns para manifestação dos fenômenos, pois ele curiosamente nunca desenvolveu a capacidade de se comunicar mediunicamente com os espíritos.

     Concluiu seus trabalhos apontando a existência da continuidade da vida após a morte física e da influência dos espíritos no mundo material. Enquanto fazia experimentos, alguns diziam que era o poder da mente de um integrante dos trabalhos que gerava as manifestações mediúnicas, mas quando o fenômeno ocorria com respostas que nenhum dos integrantes sabia; comprova-se então o fato da presença de alguma forma inteligente às sessões.

Allan Kardec codificou o Espiritismo através de Cinco Obras:

1º O Livro dos Espíritos (1856); 2º O Livro dos Médiuns (1862); 3º O Evangelho Segundo o Espiritismo; 4º O Céu e o Inferno; 5º A Gênese.

No Brasil, o Espiritismo chegou pela Bahia, por volta de 1860 e teve que se adaptar a todo o contexto religioso multicultural em que encontrava o povo brasileiro, mergulhado no domínio do catolicismo e das práticas dos cultos africanos e ameríndios.

Da Bahia se difundiu pelo país de um modo geral e com mais força nas maiores cidades de então, como na capital Rio de Janeiro. Mas foi entre as elites que as práticas foram absorvidas, praticadas e divulgadas.

O termo "espiritismo" é historicamente utilizado como designação por algumas casas ebassociações das religiões afro-brasileiras, e seus membros e frequentadores definem-se como "espíritas". Como exemplo, citam-se a antiga Federação Espírita de Umbanda e as atuais Congregação Espírita Umbandista do Brasil, no estado do Rio de Janeiro, e a Federação Espírita do Brasil, no estado do Espírito Santo. No Brasil Império, a Constituição de 1824 estabelecia expressamente que a religião oficial do Estado era o Catolicismo. No último quartel do século XIX, com a difusão das idéias e práticas espíritas no país, registraram-se choques não apenas na imprensa, mas também em nível jurídico-policial, nomeadamente em 1881, quando uma comissão de personalidades ligadas à Federação Espírita Brasileira reuniu-se com o Chefe de Polícia da Corte e, subsequentemente, com o próprio Imperador D. Pedro II, e após a Proclamação da República Brasileira, agora em função do Código Penal de 1890, quando Bezerra de Menezes oficiou ao então presidente da República, marechal Deodoro da Fonseca, em defesa dos direitos e da liberdade dos espíritas. Outros momentos de tensão registrar-se-iam durante o Estado Novo nomeadamente em 1937 e em 1941, o que levou a que a prática dos cultos afro-brasileiros conhecesse uma espécie de sincretismo sob a designação "espiritismo", como em época colonial o fizera com o Catolicismo. Na cidade brasileira de Santos, em 1910 surgiu uma dissidência do movimento espírita, que se denominou "Espiritismo Racional e Científico Cristão" e posteriormente 'Racionalismo Cristão.

Desde a segunda metade da década de 1950, alguns centros espíritas seguem a doutrina ditada pelo espírito Ramatis ( nas obras psicografadas por Hercílio Maes). Distinguem-se dos centros espíritas tradicionais em função da maior ênfase ao universalismo (origem comum das religiões) e ao estudo comparado de religiões e filosofias espiritualistas ocidentais e orientais. Nota-se também a influência mais acentuada de correntes de pensamento orientais, tais como o budismo e o hinduísmo e a proximidade com a cosmogonia do espiritualismo universalista. É comum o uso do termo Kardecismo para definição das práticas espíritas de codificação de Allan Kardec, que não têm dogmas, sacerdotes, patuás, guias, rituais e/ou objetos litúrgicos, logo não é definido como Religião, e sim como Filosofia. Na verdade, o Espiritismo é um conceito filosófico-religioso cujos maiores pilares são: a existência de um Deus criador, a partir da base de que “nada vem do nada”; o conceito de Carma; o processo de evolução espiritual através da Reencarnação; e a prática mediúnica, tendo como foco a caridade. Segundo o Espiritismo, o Universo foi criado por Deus e possui incontáveis planos, desde os mais inferiores até os mais sublimes e próximos da Divindade; a Terra se encontra entre os planos mais inferiores, daí a forte presença do mal, dos vícios, da ignorância, do sofrimento e das doenças, portanto é um dos mundos de provas e expiações. Cabe ao ser humano purificar-se na vida através das boas ações, da vida em oração, da prática constante do moral cristão, para que “queime” seu Carma e evolua, livrando-se do ciclo reencarnacionista e seja encaminhado para mundos mais perfeitos que a Terra.


Carma 🡺 Lei espiritual de Causa e Efeito, como que uma espécie de 'penalidade' ou 'benevolência' a qual todos devem pagar ou receber por algum ato realizado em prejuízo ou benefício próprio ou dos outros, nesta vida ou em outras anteriores.


Reencarnação 🡺 Processo pela qual o espírito humano passa por diversas vidas materiais, cujo objetivo é a Evolução e a “queima” do Carma.


A Doutrina Espírita acredita que o caminho para o crescimento espiritual é o moral cristão e tem na figura de Jesus Cristo o seu maior exemplo e expoente, portanto se auto considera Cristã. Segundo o Espiritismo, Jesus é um espírito dos mais altos graus de evolução e é o senhor e regente do mundo, que encarnou entre os judeus para trazer a mensagem do Evangelho, que deve ser seguido e divulgado a todos os seres humanos.

    A maior verdade do Evangelho para os espíritas é a prática da Caridade, pois sem ela não há Salvação (a plenitude espiritual e fim do ciclo encarnar-morrer-encarnar). Portanto, cabe aos espíritas levar o Evangelho pelo mundo, pregar, praticar e ensinar a fé, o amor e a caridade.

    Os espíritas possuem seus próprios locais de reuniões (sob controle de federações), onde se pratica o passe magnético, a leitura e explicação de trechos evangélicos e a prática de fluidificação das águas; muitas casas trabalham também com os passes de curas. Além das reuniões periódicas para atendimento ao público, os lares espíritas incentivam a formação espírita através de aulas e do estudo orientado e leitura das obras psicografadas.

    Para se tornar um médium kardecista deve-se passar por um longo processo de estudo e práticas espiritualistas, cujo objetivo maior é a Reforma Íntima, ou seja, fornecer condições para que a pessoa vá adquirindo hábitos cristãos do perdão, temor, disciplina, paciência, amor, esperança e caridade.

    Segundo o Espiritismo, o homem tem a capacidade de se comunicar com o mundo espiritual e isso se dá através do mecanismo da mediunidade, que é a capacidade ou dom de intermediar ou perceber algo em duas realidades diferentes. Existem diversos tipos, qualidades e variantes de médiuns e mediunidades:

 


  • Tipos de Mediunidade (principais)


Incorporação: Fusão de espíritos entre reinos/dimensões diferentes; o espírito do médium se afasta do eixo central do chacra coronário e a mente do espírito de luz (ideal) toma o comando;


Possessão: Incorporação contra a vontade;


Psicografia: Escrita mediúnica, a entidade passa a mensagem do próprio mental para o médium;


Psicofonia: Fala mediúnica, entidade toma controle da voz sem incorporar;


Psicometria: Trás informação pelo toque de objetos;


Pictografia: Pintura mediúnica;


Vidência: As imagens se formam na tela mental do médium (passado, presente ou futuro);


Clarividência: O médium vê o mundo espiritual (Glândula pineal ou 3º olho);


Clarioufativo: O médium sente o cheiro;


Clariaudiência: O médium escuta o som dos espíritos;


Pneumatofonia: Os espíritos fazem ouvir gritos e sons.


Telepatia: O médium entra em sintonia com a mente dos espíritos, na mesma frequência;


Inspiração: Algum espírito irradia ideias na mente do médium;


Intuição: Percepção clara da verdade, sem necessidade de raciocínio. O médium percebe o fato ou acontecimento sem dúvida daquilo que percebe;


Canalização: Captação e irradiação de energia em determinada frequência ou vibração;


Sensitividade: percepção mediúnica, o médium sente espíritos ou situações;


Telecinesia: Os espíritos interagem com a matéria através dos fluidos do médium;


Transporte: Capacidade de atrair a si a incorporação de um espírito;

   

Desdobramento Mental/ Astral: O guia traz o espírito do médium para ‘fora do corpo’ e anda ao seu lado durante o sono para trabalhar numa faixa espiritual;


Xenoglossia: O médium fala ou escreve em outro idioma;


Parapirogenia: É o dom se se atar fogo mediunicamente;


Autocombustão: O médium se queima só, sem afetar o lugar.


Materialização: É o fenômeno cujo médium provoca a quebra da estrutura da matéria e a refaz em outro lugar com energia;


Clonagem: Médium com capacidade de copiar ou clonar o fluido animal que morreu;


Tiptologia: Médium que provoca manifestação espiritual através da linguagem dos sinais e pancadas alfabéticas. 



  • Tipos de Médiuns (principais)


Calmos: Sempre escrevem ou agem lentamente, sem agitação.


Velozes: Os que escrevem ou agem com rapidez, o que no estado normal, não o fariam;


Convulsivos: Permanecem em estado de superexcitação, quase febril;



  • Qualidades de Médiuns


Obsedados: Os que não podem se livrar dos espíritos importunos e mistificadores e se iludem com a natureza das comunicações recebidas;


Fascinados: Os que são enganados pelos espíritos mistificadores e se iludem com as comunicações recebidas;


Subjugados: São dominados moralmente e muitas vezes fisicamente pelos espíritos maus;


Levianos: Os que não levam a sério a sua faculdade mediúnica, servindo como divertimento ou finalidades fúteis;


Indiferentes: Não tiram nenhum proveito moral das instruções recebidas e não modificam em nada sua conduta;


Presunçosos: Os que têm a pretensão de estar somente em comunicações com espíritos superiores;


Orgulhosos: Os que se envaidecem com as comunicações recebidas e acham que não tem mais nada a aprender no espiritismo;


Suscetíveis: Aborrecem-se com críticas às suas comunicações, chocam-se com a menor das observações e se afastam das reuniões em que não podem se impuser ou dominar;


Mercenários: Os que exploram suas faculdades mediúnicas;


Ambiciosos: Os médiuns que, mesmo sem vender suas faculdades, esperam obter com elas outras vantagens;


De má fé: Médiuns que tendo algum tipo de mediunidade simulam outras que não tem, devida a uma suposta maior importância;


Ciumentos: Os que encaram com despeito os médiuns mais considerados que eles e que lhes são momentaneamente mais adiantados;


Sérios: Os que utilizam suas faculdades para o bem e finalidades úteis;


Modestos: Os que não se atribuem nenhum mérito pelas comunicações recebidas e não se julgam livres de mistificações;


Devotos: Compreendem que têm uma missão a cumprir e devem, quando necessário, sacrificar seus gostos, hábitos, prazeres, seu tempo e até mesmo seus interesses materiais em favor dos outros;

Seguros: Médiuns que além do trabalho mediúnico merecem a maior confiança em virtude de seu caráter e da natureza elevada dos espíritos que os assistem, sendo, portanto, menos expostos a serem enganados;


Experimentados: Médiuns com ampla experiência mediúnica e voltados ao estudo sério; cientes de todas as dificuldades que se apresentam na prática do espiritismo. 







Bibliografia 



OLIVEIRA, José Henrique Motta de. Das Macumbas à Umbanda: uma análise histórica da construção de uma religião brasileira, 2008. 1º ed. Limeira, SP: Editora do Conhecimento.


VIEIRA, Valdo; XAVIER, Francisco Cândido. Mecanismos da Mediunidade, 2000. 4º ed. Rio de Janeiro, F.E.B.


KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos.


KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns.


KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo.





Um pouco de história - Formação do povo brasileiro



    A costa do Atlântico, muito antes da chegada das naus portuguesas, sempre foi povoada por povos indígenas que se guerreavam pela obtenção das melhores terras (não pelo modo de produção capitalista). Mas, no fim, os mais bem sucedidos foram os povos de língua tupi que dominaram a costa do atual Brasil até as entranhas do Rio Amazonas.

    Entretanto, nunca se formou nessa região uma "nação indígena" ou um Estado unificado entre os nativos, no máximo o que ocorreu foi o domínio das tribos mais poderosas sob as mais fracas, pois o que havia eram infinitos grupos indígenas, culturalmente distintos e mais hostis uns aos outros do que dóceis. As tribos eram autônomas e auto-sustentáveis, logo quando o número de componentes sociais chegava no limite, elas se separavam, formando novas tribos.

    Os indígenas variavam em muitos aspectos seu modo de vida, formando sistemas socioculturais às vezes bem distintos, mas na sua grande maioria viviam basicamente da pesca, caça e dos frutos da terra, abundantes nas abençoadas terras americanas. 

    Esse foi o cenário encontrado pelo colonizador português Pedro Álvares Cabral e seus comandados no ano de 1500: um monte de índios pelados e portadores de armas, para eles portugueses, rudimentares, tais como lanças, arcos e flechas.

    Darcy Ribeiro, respeitado autor e considerado um dos maiores intelectuais do nosso país, escreveu na sua Obra “O povo brasileiro” o seguinte:


Os grupos indígenas encontrados no litoral pelo português eram principalmente tribos de tronco tupi que, havendo se instalado uns séculos antes, ainda estavam desalojando antigos ocupantes oriundos de outras matrizes culturais. Somavam, talvez, 1 milhão de índios, divididos em dezenas de grupos tribais, cada um deles compreendendo um conglomerado de várias aldeias de trezentos a 2 mil habitantes (Fernandes 1949). Não era pouca gente, porque Portugal àquela época teria a mesma população ou pouco mais”.(Ribeiro2005:31)



Ao tomar posse das terras e fazer contato com os índios do litoral e trocar presentes, voltaram os portugueses à Europa e somente 30 anos depois (1530) resolveram iniciar o processo de colonização para não perder as terras aos outros europeus.

    Quando voltaram, trouxeram animais domesticados, soldados, degredados, padres, alguns nobres. Dividiram as terras que mal conheciam em capitanias, que se subdividiam em sesmarias, e o açúcar foi o produto base da economia colonial.

    Entretanto, as relações econômicas sobrepujaram as sociais e os índios imediatamente foram tratados como seres inferiores e muitos foram usados como escravos nos intentos portugueses e outros levados para Portugal na mesma condição.

 Os índios começaram a ser massacrados - por serem hostis, ou ir de encontro aos interesses lusitanos - ou escravizados devido à necessidade de mão-de-obra, então fugiam para o interior do continente, onde se chocavam com outras tribos hostis, além de sofrerem com as doenças do homem branco às quais não tinham imunidade.       

Segundo Darcy Ribeiro:


“Conforme se vê, a população original do Brasil foi drasticamente reduzida por um genocídio de projeções espantosas, que se deu através da guerra de extermínio, do desgaste no trabalho escravo e da virulência das novas enfermidades que os achacaram. A ele se seguiu um etnocídio igualmente dizimador, que atuou através da desmoralização pela catequese; da pressão dos fazendeiros que iam se apropriando de suas terras; do fracasso de suas próprias tentativas  de encontrar um lugar e um papel no mundo dos ‘brancos’. Ao genocídio e etnocídio se somam guerras de extermínio, autorizadas pela Coroa contra índios considerados hostis, como os do vale do Rio Doce e do Itajaí.(...)Apesar de tudo, espantosamente, sobreviveram algumas tribos indígenas ilhadas na massa crescente da população rural brasileira. Esses são os indivíduos que se integram à sociedade nacional, como parcela remanescente da população original.”(Ribeiro2005:144,145)

 

 

Outro aspecto da colonização foi que os portugueses não traziam mulheres, somente homens sedentos de riquezas fáceis, durante pouco tempo na Colônia, quando retornariam à pátria mãe para, aí sim, constituírem família segundo os moldes da época, o matrimônio católico.

    Mas não foi isso que ocorreu na maioria dos casos, pois a ausência de mulheres européias não impediu os portugueses do desejo sexual e logo apareceram os mamelucos, filhos de pais brancos e mães índias. 

    Segundo Caio Prado Jr, outro exímio intelectual brasileiro:


“Muito importante, contudo, entre os fatores da mestiçagem brasileira, foi o modo com que se processou a emigração portuguesa para a colônia. O colono português emigra para o Brasil, em regra, individualmente (...). Daí a falta de mulheres brancas. Mesmo quando o colono pretende trazer família, ele deixa isso para mais tarde, para quando pisar em terreno firme e já pode prover com segurança à subsistência dela. Na incerteza do desconhecido, ele começa partindo só.”



Os mamelucos aumentaram em números e logo, passaram a constituir um grupo social próprio, contudo rejeitados pelas suas matrizes constituintes, ou seja, eram renegados pelos brancos e pelos índios.

    Os índios de um modo geral se incorporaram ao Brasil biologicamente, espalhando seu DNA entre a população. Contudo, seu modo de vida e sua visão de mundo não influenciaram a fundo o modo de pensar da sociedade brasileira como foi o caso dos negros. 

     O que deles absorvemos foi parte de sua religiosidade, hoje encontrada sob a luz da Jurema, do Catimbó, do Candomblé de Caboclo e da Umbanda, mas ainda assim essa religiosidade foi transfigurada de sua forma original pela influência de outros modos de pensar.

    Com o desenvolvimento da Colônia, fez-se aumentar a carência de mão-de-obra e o custo pela obtenção e manutenção de índios escravizados era muito oneroso, tornando cara a compra deles. As tribos também se refugiavam cada vez mais para dentro do continente, pois conheciam as terras, tornando difícil sua captura, além disso, preferiam morrer a trabalhar. 

Das regiões da Colônia, o Nordeste foi o projeto mais bem sucedido, criando logo a necessidade de mais braços para o trabalho. A solução encontrada pelos portugueses foi trazer os negros africanos como escravos para o Brasil, pois eles eram mais bem adaptados ao trabalho ritmado e Portugal já praticava a escravidão dos africanos antes da descoberta das terras americanas, portanto tinha experiência na obtenção, transporte e venda de africanos. 

    As terras que seriam futuramente o Brasil receberam em seus braços grandes levas de negros africanos e, como não poderia ser diferente, o homem branco juntou-se sexualmente às negras e mais uma vez outro componente social surgiu, o mulato. 

Tínhamos no Brasil, portanto, originalmente o branco colonizador, o negro escravo, o índio nativo, depois o mameluco e o mulato. Surgiu, também, mais um componente social, o cafuzo, resultado da união entre o negro e o índio. No entanto, foi em menor número, pois estes dois grupos – índios e negros - não possuíam a mesma liberdade entre sí para as uniões em relação ao homem branco. 

Através do tempo, enfim, é a miscigenação entre o branco e o negro que predominou, então passaram a constituir os maiores grupos numericamente.

Esses foram, portanto, os componentes básicos da nova nação que surgia no mundo, nas terras portuguesas além-mar, eram os brasileiros. 

    Mais tarde, quando o açúcar perdeu força no mercado mundial, foi a vez do ouro e do diamante na Colônia, principalmente do atual estado de Minas Gerais, quando levas de negros escravos não paravam de chegar ao Brasil, então todos desgarrados da Mãe África nos "tumbeiros" (navios "negreiros") que atravessavam o Atlântico em condições desumanas.

Apesar da forte e marcante presença do mestiço na sociedade, não se identificavam com nenhuma de suas matrizes étnicas originais, pendendo ora ao lado dos brancos quando suas condições de vida eram melhores, ora se identificando com os negros e índios.

    A maioria deles tornou-se criadores de gado, artesãos ou pescadores, colonizando principalmente as terras secas do Nordeste e regiões mais ao atual Centro-Oeste com o gado bovino.

Depois do ciclo econômico do ouro foi o café, que migrou das terras fluminenses para o Vale do Paraíba, depois para São Paulo e daí para o Oeste paulista e Paraná. Foi o negro africano a principal força motriz desse ciclo econômico.

Com o fim da escravidão no final do século XIX, começaram a chegar os imigrantes europeus ao Brasil, em especial os italianos, que vinham para ocupar as vagas dos negros libertos e expulsos das fazendas de café e demais atividades econômicas. Aliás, essa substituição praticamente alicerçou o Brasil como a periferia do capitalismo, promoveu a completa exclusão do negro na sociedade e catalisou o processo de formação de favelas e cortiços urbanos.

A chegada dos imigrantes mudou mais uma vez as características básicas do povo brasileiro. Se antes tínhamos um país cuja população era formada basicamente por pessoas de pele mais escura, a mistura desses elementos mestiços com os europeus, em especial no Sul e Sudeste, “clareou” (digamos, ainda que isso seja de uma imundice dizer) um pouco a “pele dos brasileiros” e confinou o negro ainda mais aos rincões e favelas urbanas, sempre vítima do preconceito racial.

A imigração européia trouxe, claro, muitos elementos que se adicionaram no modo brasileiro de vida, mas não chegou a expressar diferenças culturais relevantes e ao extremo entre os grupos que as absorveram. 

Diferente da Argentina e do Uruguai, que assumiram as características européias dos imigrantes que lá aportaram, no Brasil foi mais o europeu quem se adaptou ao nosso jeito brasileiro de ser.

Mais uma vez, citaremos o autor Darcy Ribeiro para explicar o papel dos imigrantes europeus na sociedade mestiça brasileira:


“Apesar de numericamente pouco ponderável, o papel do imigrante foi muito importante como formadores de centros conglomerados regionais nas áreas sulinas em que mais se concentrou, criando paisagens caracteristicamente européias e populações dominadoramente brancas. Conquanto relevante na constituição racial e cultural dessas áreas, não teve maior relevância na fixação das características da população brasileira e da sua cultura. Quando começou a chegar a maiores contingentes, a população nacional já era tão maciça numericamente e tão definida do ponto de vista étnico, que pôde iniciar a absorção cultural e racial do imigrante sem grandes alterações no conjunto.”


O que mais se verifica no processo de integração estrangeira no Brasil foram as oportunidades de trabalho, delegadas oficialmente pelo próprio Governo e pela sociedade aos brancos, em detrimento dos negros recém-libertos, que foram excluídos socialmente e sobreviveram como puderam, heroicamente, nas periferias urbanas dos centros econômicos, germinando assim as primeiras favelas e malocas.

O Brasil é um país multirracial, um país cuja mestiçagem é vista com bons olhos, cujo preconceito racial até os dias de hoje é muito grande e disfarçado. Infelizmente a pirâmide social segue em muitos aspectos o padrão étnico no Brasil.

Somos filhos de índios, negros, mestiços, portugueses, italianos, japoneses, alemães, árabes e outros mais, conforme podemos verificar na árvore genealógica do nosso povo, mas discriminamos nossos compatriotas pela cor da pele, pelos cabelos encaracolados, ou qualquer diferença fenotípica que vai se distanciando dos traços típicos dos “brancos”.

Termino o assunto com uma célebre frase de Caio Prado Júnior, que pode ser refletida para melhor evolução de cada um contra o preconceito de qualquer natureza:


“Uma gota de sangue branco faz do brasileiro um branco, ao contrário do americano, em que uma gota de sangue negro faz dele um negro.” (Prado Jr. 1997:109)